◢ Alú Rochya
Uma ordem mundial caminhando para sua dissolução vai fragmentando a realidade e sumindo o mundo no caos. A lógica consequência disso é tudo o contrário a um estado de paz. As profundas mudanças estimuladas pela tecnologia, a velocidade de transmissão das informações empilhando montanhas de verdades e mentiras, as incertezas sobre o futuro e a falta de estrutura das pessoas para processar e assimilar esse imenso pacote de dados, derivam em sofocantes estados de angústia.
Relatórios da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam um dado alarmante: ansiedade e depressão afetam hoje quase um bilhão de indivíduos ao redor do mundo.
As ameaças, os perigos, as incertezas e as dores se multiplicam, configurando um panorama aflitivo, onde o sofrimento seria quase que lógico e inelutável. Seguindo esse fio, aceitando que é assim que as coisas funcionam, acaba-se por normalizar o que não é nem pode ser uma norma: sofrer.
Não obstante, existe uma valorização intelectual e até um estímulo do sofrimento, como se fosse uma virtude humana, a descobrir, a conquistar.
Se você entrar no Google e pesquisar a palavra em questão, vai se deparar com uma boa quantidade de apreciaciones positivas:
- o sofrimento é necessário
- o sofrimento nunca é em vão
- o sofrimento produz paciência
- o sofrimento alimenta mais a sua coragem
- o sofrimento é o megafone de Deus
- toda alegria vem do amor e todo amor inclui o sofrimento
- nunca pais algum se elevou sem se ter purificado no fogo do sofrimento
- o sofrimento é o melhor remédio para acordar o espírito
- muito aprendeu quem bem conhece o sofrimento
Então, ¿seria mesmo que o sofrimento tem um sentido positivo? ¿Seria ele, porventura, uma ferramenta de evolução? ¿Acaso se faz necessário sofrer para alcançar a felicidade?
Alguma coisa parece estar torta nessa lógica de olhar para a vida dos humanos como seres condenados a andar carregando cruzes e, ainda por cima, achar isso um trunfo no caminho de seu desenvolvimento espiritual. Porém, desde que o tal de paraíso acabou e a vida terrena virou em múltiplos infernos, tivemos - e temos - uma variedade de influencers de plantão propagando o caráter benéfico do tormentoso estado de ânimo.
Ateus como Arthur Schopenhauer, cristãos irremediáveis como Fiódor Dostoiévski ou nihilistas como Friedrich Nietzsche, entre tantos outros, reivindicavam por igual o sofrimento como o caminho mais eficiente da aprendizagem das almas neste planeta.
Talvez signado por sua atormentada existência pessoal, Nietzsche considerava que o sofrimento, ao invés de se tornar um fardo, deve ser encarado como instrumento de superação do próprio homem em direção a um além-homem, aquele super-homem que ele pregava.
Para Dostoiévski, o sofrimento é um componente inevitável e até necessário para a condição humana, especialmente para aqueles com grande inteligência e um coração profundo (falava dele mesmo?), levando o indivíduo a uma compreensão mais ampla de si próprio e da existência. Ele chegou a dizer: temo não ser digno do meu sofrimento.
Schopenhauer, que suspeitava de um Deus malévolo, descrevia o mundo como uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica. E, talvez numa interpretação egoica de sua própria vida azeda e escura, chegou a afirmar que quanto mais elevado é o espírito mais ele sofre.
Se aceitarmos essas asseverações, devemos concluir que a iluminação espiritual seria algo assim como uma espiral cósmica de crescente padecimento. ¿E Deus, então, na desmesura de sua evolução, qual seria o grau imensurável de seu padecimento? Dá para imaginar?
Não se faz fácil compreender essas alegações. Porém, com pretensões filosóficas do tipo foi se municiando, ao longo da história, os fundamentos propícios do sofrimento.
O via crucis das religiões
Por cima de filósofos, escritores e pensadores variopintos, foram as religiões quem estabeleceram robustos corpus de argumentação sacramentando o sofrer, apoiados em interpretações que vêm sendo ensaiadas desde os textos do Antigo Testamento.
A igreja católica teve destaque nessa tarefa, reivindicando "o valor salvífico do sofrimento", sintetizado em seu maior fetiche: a imagem de um Cristo sangrante e moribundo cravejado numa cruz.
O papa João Paulo II, em sua Carta Apostólica Salvifici Dolores, afirmava que os que sofrem "foram chamados, de uma vez para sempre, a tornarem-se participantes dos sofrimentos de Cristo ao fim de completar com o próprio sofrimento o que falta aos sofrimentos desse Cristo".
Note você que ele afirma que existem pessoas que foram divinamente escolhidas para sofrer - tornando-se sócios do Cristo -, e os condena ao sofrimento para sempre. E ainda decreta que a esse Cristo lhe faltou sofrer um bocadinho mais.
A visão reduz a amplitude e a profundidade da mensagem de Jesus à valentia de um ato sacrificial como é a entrega à crucifixão, uma foto póstuma que mal pode encobrir a vida e a obra do Messias e seu transcendente legado.
A carta de João Paulo II - um verdadeiro antipapa - parece um exercício subliminal de estelionato espiritual, que bate de frente com a própria essência crística expressada no chamado de Jesus: "Tenho-vos dito isso para que a minha alegria permaneça em vós, e a vossa alegria seja completa" (João 15:11).
A própria ressurreição de Jesus sempre foi vista como um momento de alegria explosiva que muda o sentido de tudo, curando a tristeza e oferecendo esperança. Ele mesmo prometeu que, apesar da tristeza inicial, o coração dos seus seguidores se alegraria, confirmando a essência celebratória da vida e mostrando porque Jesus é considerado a alegria dos homens.
Quando a Igreja Universal lançou no Brasil o bordão "pare de sofrer" não o fazia à toa. Os protestantes neopentecostais liderados pelo hoje bilionário bispo Edir Macedo saíram a disputar uma freguesia que, até então, tinha a igreja católica como o principal refúgio espiritual.
Percebendo o fluxo de energia positiva e festiva do povo brasileiro, o marketing tão bem-sucedido dos evangélicos preservou a cruz como símbolo, porém tirou Jesus da ignominiosa imagem e passou a divulgar a palavra de um Cristo vivo, fazendo um refresh dos ensinamentos de suas parábolas - mesmo que quase sempre adulteradas. Desse jeito, na voz altissonante dos pastores eletrônicos, botaram a religião mais perto da cotidianeidade das pessoas, especialmente a financeira.
Mesmo assim, o discurso evangélico mexe o tempo todo com o sofrimento humano para poder receitar seu antídoto. Trabalham em cima da pessoa sofredora e falam para ela: "Tudo bem, você está sofrendo, venha para Jesus, a porta é esta aqui e está aberta para você se salvar".
Macedo lança seus urubus trás a carne mortificada de seus seguidores, não para liberá-los de uma algema psicológica, senão para incutir nas suas mentes a dependência emocional de um salvador que chegará um dia desses. Entretanto, a Universal se oferece como o manto que abrigará seus fiéis das inclemências dos últimos dias e como o canal exclusivo e infalível para receber o passaporte à salvação. Marketing puro, construção crístico-moralista de um mercado com clientela cativa: o povo sofredor.
O sofrimento virtuoso
Não apenas as igrejas evangélicas e católicas pecam de sofridão dogmática. As outras vertentes da tradição judaico-cristã também interpretam o sofrimento como uma virtude.
O famoso rabino judeu ortodoxo Shneur Zalman de Liadi destacava-se por não ter papas na língua. Assim, ele sustentava, sem o menor rubor, que "é melhor para a pessoa sofrer, mesmo se for incapaz de servir a Deus adequadamente devido ao sofrimento... É até mesmo preferível para sua alma, do que se fosse uma pessoa completamente justa, mas sem sofrimento". Traduzindo: o sofrimento é condição sine-qua-non para alcançar a salvação.
Pense no seguinte: uns 6 milhões de judeus foram perseguidos, encarcerados, submetidos a todo tipo de humilhações e torturas, feitos cobaias para experimentos genéticos diabólicos e, finalmente, massacrados pelo regime nazista da Alemanha, liderado por Adolf Hitler. Seguindo o entendimento do rabino, para aqueles homens e mulheres infelizes (adultos, jovens, idosos, crianças), o horror desse holocausto teria sido até mesmo preferível para salvar suas almas. É aceitável?
No reverso dessa mesma moeda, a perspectiva islâmica tenta ver que "Deus aflige seus servos com sofrimento para moldá-los no tipo de pessoas que Ele quer que sejam". As tribulações também podem ser um castigo para os pecados cometidos, servindo como um meio de purificação.
Ainda mais: consideran que as pessoas que suportam o sofrimento com paciência e fé "podem desejar ter sofrido mais no mundo terreno, se soubessem a recompensa eterna reservada para elas após o Dia do Julgamento".
Isso poderia ser encuadrado como propaganda enganosa. Não existe a tal de recompensa eterna. Depois de cumprir seu ciclo por estos pampas, cada um deixa os restos de seu corpo por cá e do outro lado inicia mais uma etapa de sua vida, outro ciclo, com as mudanças que cada entidade tenha incorporado a seu ser. E pronto. Não existe distinção, galardón, premio -tampouco castigo- porque a vida não é uma competência, nem cá nem lá.
![]() |
Para Frida Kahlo a vida não merecia ser entendida através de seu sofrimento físico. E a arte era uma forma de transformar a dor em expressão artística. |
O hinduísmo, por sua vez, reivindica a carga do sofrer como uma consequência lógica para aquelas "almas que tiveram maus comportamentos em vidas passadas", devendo pagar seus pecados nesta vida, experimentando "tremendos sofrimentos". Alguma coisa assim como um castigo superlativo para aprender a se comportar.
¿Será que seus deuses e deusas são tão básicos e cruéis assim? ¿Qual é o amor de um deus que nos dá uma chance de vida neste planeta com a deliberada finalidade de que soframos, em castigo pelos maus comportamentos de outras vidas anteriores? ¿Esse Deus está mesmo do nosso lado?
Religião, filosofia, ciência, magia. Um pouco disso tudo constitui a doutrina espírita, que não faz por menos que outras crenças na hora de interpretar o sofrimento.
Hippolyte Léon Denizard Rivail era um influente educador francês, porém ele ganhou fama sob o pseudônimo de Allan Kardec, o chamado codificador do espiritismo. Ele dizia que falava com uma entidade superior que chamava pelo nome de espírito da verdade e que, desses papos mediúnicos, ficou sabendo que a Terra era um planeta de expiação e provações.
¿O que é expiação e provação? A expiação é um sofrimento em forma de castigo supostamente para reparar uma culpa, enquanto a provação é um sofrimento que coloca à prova as convicções e a moral de um indivíduo. Quer dizer, primeiro você é colocado a sofrer para pagar uma pena antiga e depois é colocado de novo no modo sofrimento para provar até onde você aguenta firme em suas convicções. Portanto, para os espíritas, o sofrimento não é apenas inevitável, senão obrigatório no caminho de nossa evolução e ascensão ao encontro de Deus.
Esse parece ser o espírito do espírito das religiões: a Terra é um vale de lágrimas, estamos aqui para apanhar direito e, se aceitamos os padecimentos, após morrer e deixar o planeta, do outro lado do véu teremos uma vida maravilhosa.
Se você parar para pensar, é a mesma metodologia rudimentar aplicada pelos homens na domesticação de animais, no controle de grupos humanos competitivos e, especialmente, no adestramento e educação de crianças.
Uma fórmula horrorosa onde os animais tentarão performar os comandos que lhe são dados em troca de comida e afeto, os competitivos lutarão entre eles em troca de benêficios materiais e reconhecimento egoico, e as crianças procurarão agradar para serem amadas e assim sentir garantida sua sobrevivência. E todos sentirão o tempo todo a angustiante ameaça do medo de serem castigados. Nenhum fará nada por consciência, concordância ou amor.
É o velho e obsoleto sistema de controle exercido pelas chefias humanas e humanoides, a base psicológica em cima da qual exerce seu domínio mental o que é chamado de Matrix, que aprisiona a humanidade em uma realidade artificial e a mantém alheia à verdade.
Como é de praxe, todos usam - em vão, claro - o nome de Deus para justificar sua posição. Eis aí que surge uma pergunta: ¿Pode-se acreditar que uma entidade infinitamente superior a nós, como é a divindade da criação e do amor incondicional, use a mesma metodologia primitiva e tosca de seres infinitamente inferiores como os humanos?
Um paraíso para isso?
Você tem uma ideia de como o planeta Terra é, né? Então, imagine por um momento o planeta sem seres humanos. Visualize as florestas, as montanhas, os rios, os mares, os lagos, as planícies, os animais, as flores, as frutas, as mudanças de estações, os dias de pleno sol, a chuva, os ventos, as cores, os cheiros, os sabores, e por aí vai. ¿Não é um lugar extraordinário? ¿Não é mesmo um paraíso?
Ora bem, ¿você acha que o ser humano seria colocado num lugar desses para sofrer? ¿Lhe ofereceriam toda essa logística de apoio 5 estrelas com o sofrimento como finalidade?
¿Mas quem seriam esses estranhos deuses que teriam criado uma fórmula tão contraditória, esquisita e até perversa? Um paraíso para sofrer.
Todos os que estamos aqui somos ETs, extraterrestres. A maioria dos encarnados pertence à espécie humana. Humanos e não humanos, todos somos moradores de diversos espaços siderais da galáxia, mais perto ou mais longe do planeta e, até mesmo, de outras galáxias. A maioria somos almas mais ou menos evoluídas, mais ou menos ruins. E fomos botados nesse planeta para aprendermos o que é bom, não o que é ruim. Daquilo que é ruim já somos mestres e não é com mais ruindade que vamos evoluir.
Então, imagine o planeta como era sem a intervenção humana, aquele jardim do Éden. Aí chegam almas - novinhas, ignorantes, em estado bruto, cheias de imperfeições -, a passar um tempo no meio dessa maravilha. Por mais ruins que sejam esses ETs, só com assistir cada dia ao acontecer da vida natural e seus milagres, a um amanhecer, um pôr-do-sol, uma noite estrelada, já passam a compreender como é esse negócio da existência, os ciclos da vida, esse complexo entramado com um funcionamento tão simples como eficiente.
E as criaturas vão enxergando, vão experimentando, imitando, fazendo e desfazendo, tecendo, destecendo e voltando a tecer a maravilha da vida. Com o tempo - talvez séculos, milênios, eras - essas almas, indo e vindo, começam a se parecer à maravilha do planeta e se tornando também seres maravilhosos, prontos para passar ao próximo estágio, agora mais evoluídos, aperfeiçoados, com mais e melhores fundamentos para ser e oferecer na troca com outras entidades.
Essa era a ideia original, o plano original. Fazer da Terra um centro de treinamentos que pudesse ser utilizado por almas ainda pouco desenvolvidas para encarar uma experiência evolutiva, num ambiente propício e amoroso.
E a chave disso era (ainda é) o amor, a energia que emana da Fonte Central da galáxia, essa inteligência superior e força imensurável que movimenta em inacreditável harmonia estrelas, planetas e sucedâneos na infinita dança astral.
A informação que vai chegando e revelando verdades até pouco tempo ocultas nos conta que a humanidade é um dos grupos álmicos menos evoluídos da nossa galáxia Via Láctea. Para concordar com essa posição no ranking, basta lembrar que já aqui na Terra não somos nada demais. Pertencemos a um grupo de seres mamíferos chamados primatas, integrado por macacos, símios, lêmures e humanos, compartilhando entre 98% e 99% do DNA.
Tudo bem, não somos grande coisa, mas não é com castigo e sofrimento que iremos melhorar. À criança pestinha não vamos ajudá-la batendo nela, ameaçando-a, deixando-a de castigo, fazendo-a sofrer, mas com compaixão, abraçando-a, cuidando dela, amando-a, fazendo com que sinta, na pele e na alma, a energia sanadora do amor. Desse jeito, podemos gerar nela a confiança suficiente para que possa recepcionar os ensinamentos de que está precisando sobre como é andar por este mundo.
Crianças álmicas que somos, fomos trazidas ao paraíso por um projeto amoroso que busca os melhores caminhos para nosso desabrochar em flores maravilhosas que, mais tarde, possam fazer contribuições mais qualificadas ao processo de expansão e evolução de nossa galáxia.
Mudaram as regras do jogo
Se o projeto era esse, porque as grandes religiões, supostos pilares do plano divino, têm feito do sofrimento o via crucis ineludível para uma suposta salvação de nossa alma?
Em primeiro lugar, devemos lembrar que religião é uma palavra cuja origem e significado é re-ligar. Nomeava-se assim a tarefa de ajudar os humanos a voltar a se ligarem com aquele plano original e sua energia divina porque tinham se desligado dessa realidade e do Plano Mestre e aí perderam o rumo e o prumo. Mas, o que aconteceu?
Aconteceu que aquele plano original para a evolução humana foi brecado e mudado drásticamente por forças espirituais que discordavam dele e tomaram o controle da Terra. Consideravam que o caminho amoroso era lento demais, que as almas, apelando ao livre arbítrio, postergavam seu aprendizado, desencarnando e encarnando sem limites de oportunidades e que não eram estimuladas o suficiente nem muito menos compelidas a abraçar seu próprio desenvolvimento individual. O que era tudo verdade. Esse era - esse é - o plano divino.
Esse plano atende a processos e não a metas temporais - sempre colocadas num futuro desconhecido e incerto. Cada alma é um pedacinho único do cosmos e seus tempos dependem da natureza dessa entidade. O plano divino guia, orienta, sugere, mostra, mas deixa essa alma fazer suas escolhas com seu livre arbítrio, no tempo que ela achar certo. Entretanto, essa alma é alimentada com a energia do amor, que é, basicamente, força e inteligência de altíssima qualidade.
Mas as regras do jogo foram mudadas. Achando-se que a evolução das almas seria mais rápida se fossem diretamente estimuladas, interferiu-se no processo natural, propiciando um sistema de competição entre elas.
Assim, as pessoas foram de uma cultura colaborativa e de confiança no próximo para o contrário. A ação humana passou a ser regida pelos verbos competir, disputar, confrontar, matar, guerrear.
O que antes era conduzido pelo amor agora é comandado pelo ódio - ao outro - e pelo medo - do outro. O outrem, que era tido como outro eu, agora é um alien, um alguém alheio a mim e, portanto, uma ameaça, um potencial inimigo.
Para isso, o sistema que passou a ser o dominante - em suas diversas expressões - deslocou o eixo do espiritual para a matéria, porque na matéria poderia funcionar melhor a competição, especialmente se botassem os seres humanos na disputa pela sobrevivência do corpo físico. O projeto previa que aqueles que desenvolvessem mais e melhores qualidades resultariam os vencedores das lutas.
Depois, aplicando a fórmula num processo permanente, esses vencedores seriam desafiados por outros concorrentes e novas confrontações viriam, promovendo novos vencedores ainda mais qualificados, mais evoluídos.
Aos poucos, com o foco na matéria no intuito de sobreviver, os humanos foram se desligando do espiritual, do argumento essencial que justificava a passagem dessas almas pela Terra e que não era outra coisa que seu próprio desenvolvimento, aprendizagem, crescimento.
Verdade que, para isso, neste plano mais denso, precisavam de seu corpo - mais denso também. Mas o corpo era apenas o veículo, não o ser mesmo. Só que o medo gerado pelas novas condições foi se multiplicando até criar uma teia inconsciente coletiva que permitiu o controle mental da população por um sistema que alguns o chamam de Matrix, a matriz do mecanismo dominante.
Claro que a divindade não deixaria que o campo se fizesse orégano para os novos comandantes. Profetas foram chegando e se multiplicaram pelo mundo afora levando a verdade, tentando desmentir o novo paradigma evolutivo. Em seguida, seus seguidores passaram a se organizar e começaram a aparecer as religiões, que procuravam religar o ser humano à verdade: ninguém precisava ter medo pela sobrevivência, pois o planeta era abundante demais, e era assim para permitir que todo mundo atendesse seu plano pessoal de evolução, único sentido de sua presença neste plano.
Dois modelos de evolução álmica - e até galáctica, poderíamos dizer -, entravam em disputa.
Sabendo do poder espiritual que as religiões carregavam, a Matrix não deu bobeira e passou a infiltrar e, enseguida, dominar o comando das religiões, até colocá-las ao serviço do establishment, usando-as também para a estruturação da educação e o controle da família.
As religiões não estão hoje maiormente a serviço da divindade, senão a serviço do sistema imperante. Já não trabalham para re-ligar, senão todo o contrário.
Competir, confrontar, guerrear é duro, gera medo, gera ódio, e ódio e medo fazem sofrer. Aí é que aparecem os pseudos psicólogos, filósofos, pensadores e, notadamente, as pseudo-religiões, todos a serviço da Matrix, para convencer você de que sofrimento é uma coisa natural desta vida, lógica nas relações humanas e até benéfica no espiritual, pois se você aceita estoicamente sofrer neste mundo, será compensado generosamente do outro lado do véu, claro, após sua morte.
Na verdade, procuram que as pessoas aceitem mansamente as regras do jogo. Por uma parte, por acreditar que esse é o caminho da evolução mais rápido, mais eficaz e melhor controlado, e por outra, para que, nas consequências desse jogo de livre competência, as elites possam concentrar riquezas materiais e com isso acrescentar seu poder a fim de sustentar a luta contra as forças da natureza divina.
Para isso, têm que manter as multidões ralando duro para comprar até aquilo de que nem precisam, pois é daí onde surge o ganho. Assim, enquanto os mercados de toda classe publicitam a venda de produtos de todo tipo prometendo alegria, prazer, estatus e felicidade, os marketeiros do sofrimento fazem o trabalho sujo, embaucando as pessoas, lhes oferecendo um paraíso celestial no futuro se conseguirem aguentar se sacrificando hoje no inferno da Terra.
![]() |
| O sofrimento cria problemas artificiais que enfraquecem nossas condições, esterilizam nossas possibilidades, roubam nosso tempo. |
Estamos sendo obscenamente trapaceados por um sistema que tenta fazer-nos abraçar a ideia de que, nesta vida, o sofrimento é inevitável e até necessário.
O objetivo é nos manter fracos e submissos para facilitar a padronização de nossos atos e controlar nossas decisões, fazendo com que a subserviência funcione no modo automático do inconsciente coletivo. Ameaçadas pelo medo, cegadas pelo ódio, desarticuladas pela ignorância, consumidas pelo consumismo, as pessoas acabam sofrendo, e pessoas sofrentes são mais fracas, resultando mais fácil de serem manipuladas e submetidas.
Essa padronização leva mais de 10.000 anos sendo trabalhada e, nas últimas décadas, o salto tecnológico possibilitou uma mudança radical por vias da cibernética - em grego "arte de governar"- que permite processar a informação e a comunicação para controlar e regular o comportamento de um sistema, no caso, um sistema social.
Um claro exemplo disso são os celulares, que mantêm as pessoas plugadas a subsistemas de informação, compras e entretenimento que vão modelando suas mentes, estimulando a adesão a pensamentos, sentimentos e emoções hegemônicos propiciados pelo sistema geral.
A consequência da padronização do sofrimento foi sua normalização, uma ideia equívoca, porém arraigada em nossa humanidade. Sofrer faz parte é um frase que traduz um padrão de aceitação, alimentando comportamentos repetitivos, confinando os seres num círculo vicioso de sofrimento.
Sequestradas na masmorra escura das emoções de seus dramas, as pessoas não conseguem enxergar qualquer luz no fim de algum túnel, nem que seja uma janelinha de esperança. E acabam aceitando e assumindo o que parece não ter jeito. O que amiúde deriva até na romantização da sofreguidão, como é atestada num tango argentino que diz: primeiro tem que saber sofrer / depois amar / depois partir / e emfim andar sem pensamento...
Como o sofrimento não é natural, isso cria problemas artificiais que enfraquecem nossas condições, esterilizam nossas possibilidades, roubam nosso tempo, obstaculizam o regozijo alegre com que deveríamos existir, apesar dos pesares, porque o mundo é cruel, sim, mas a vida é bela e vale a pena experimentá-la, aprender o que ainda não sabemos, o que sempre é uma maravilhosa descoberta.
O sofrimento é uma escolha
Vida e dor são um par inseparável. Nenhuma das duas existe sem a outra. Desde o nascimento até a morte. Se não temos vida, não temos qualquer dor, a morte não dói. Se não sentimos dor, a vida pode ser uma luz fugaz.
A dor é um recurso que ativa alarmes se alguma coisa está afetando nosso corpo. O alerta é acionado por nociceptores, que são terminações nervosas livres que detectam estímulos potencialmente perigosos e enviam sinais para o sistema nervoso central, onde se disparam sensações sensoriais e emocionais desagradáveis por alguma coisa fora do script estar acontecendo. Essa sensação é chamada de dor. E, de modo imediato, o cérebro ordena ações para brecar um perigo iminente, protegendo a vida do corpo.
Quer dizer, a dor é inerente à vida e pode acontecer por eventos físicos (lesões, cirurgias, tratamentos de saúde, velhice, condições precarias de vida...) ou emocionais e psicológicos (traumas, perdas, estresse, frustrações, culpas, rejeição social...). No módulo orgânico que ocupamos, chamado corpo, a dor é tão natural e necessária como respirar. Ela nos ajuda a processar a experiência do viver, de estar no mundo fazendo o roteiro de aprendizagem que temos de trilhar como almas.
As vezes, a dor tem uma causa visível e uma tradução física, como se queimar uma mão com fogo. Outras, podem ter uma origem invisível e um impacto interno, emocional, como uma decepção. Em todos os casos, em tanto almas, podemos tirar leições simbólicas que servem para aprimorar nosso ser.
Por isso, não há imunidade para a dor nem anestesia para a vida.
Nem tudo é dor, porém até o que é bom às vezes dói. Como um parto, como pisar com os dedos nas cordas do violão, como chutar uma bola, como acabar com um relacionamento ruim.
A dor é apenas um aviso, uma pista, um indício. Para dar respostas a emergências, para manejar os limites, para ampliar nossa consciência, tirar lições, corrigir o roteiro. Ela não precisa permanecer contigo, a não ser que você não entenda o recado que ela quer te dar. Quando se compreende o seu significado, você já pode responder e a resposta fará com que ela vá embora.
Já o sofrimento é a persistência da dor. O aviso trava e fica repetindo a mensagem em modo sem fim. A dor se faz crônica.
Mas, porque a dor persiste? Simples, porque não demos a resposta pertinente. Ignorância, medo, autoabandono, crenças, culpa, vitimismo, etc. Algo faz com que deixemos que a dor sobreviva no tempo. É uma escolha, consciente ou inconsciente. Podemos sofrer ou não sofrer, é opcional, não é inevitável.
Depois da maceração cerebral a que fomos submetidos durante milênios, quem manda é o inconsciente coletivo. Olhamos para os demais e registramos uma aceitação geral do sofrimento como inevitável e até necessário.
Mas não, não é necessário sofrer. O sofrimento não é nem poderia ser jamais uma necessidade para coisa nenhuma que se pretenda boa.
Evoluir, crescer, melhorar, desenvolver todo o potencial de inteligência, eficiência e amorosidade que existe em cada átomo é coisa boa, positiva. E esse é o sentido da vida.
Se nessa viagem experimentamos contratempos, se pegamos chuva, seca, frio, calor, sede, fome, doença, solidão, frustração, perdas e passamos pela experiência da dor, é outro papo. São percalços do caminho, tão imperfeito como tudo o é. A dança entre as causas e os azares que faz parte da grande aventura de viver.
No entanto, não precisamos transformar um tropeço, um erro, um acidente, uma adversidade, numa dor permanente transformando-a num sofrimento sem fim. Sofrer não é uma fatalidade e muito menos uma condição para achar o sentido da vida.
Se, em vez de assumir o sofrimento como inevitável, indispensável, mudarmos a perspectiva e passarmos a analisar objetivamente o que realmente acontece, qual o fato que disparou nossa dor primeiro e depois nosso sofrer, estaremos encarando a realidade, dissipando as nuvens escuras da ilusão, correndo os véus dos enganos da educação, dos mandatos familiares, dos dogmas religiosos, dos condicionamentos culturais para deixar transparecer a verdade nua e crua, que às vezes dói mas não tem jeito.
Com a realidade - que a única verdade - diante de nós esse sentimento de agonia/desespero/incompreensão/negatividade/impotência sofre um choque. Você começa a perceber que existe uma desproporção entre a causa e o efeito, uma espécie de exagero, de sem razão.
Nesse ponto, começamos a jogar luz sobre nossos pontos fortes e fracos, procurando respostas e soluções além da fatalidades negativa.
Se, por exemplo, perdemos um ser querido, pode acontecer que fiquemos fixados no sofrimento. Mas, se tentamos compreender o que é a morte, o apego, a frustração, a transcendência da alma, o ciclo natural da existência onde nada se perde e tudo se transforma - aqui e em qualquer parte do universo -, poderemos começar a ver que o sofrimento não tem basamento na natureza. Sua aparição é disparada por gatilhos emocionais ou psicológicos, onde nada é real, tudo é elaborado subjetivamente pelo indivíduo. E, portanto, passível de ser mudado por nós mesmos. E transformar a dor do impacto daquela morte numa experiência diferente, positiva, regenerativa, ressurreccional.
O negócio vital é a alma
O que permite que o sofrimento nos entre a saco, como uma facada no coração, é a falta de consciência sobre a realidade, sobre o que verdadeiramente é a galáxia, as estrelas, o planeta e, enfim, a gente. E de como isso tudo faz parte indivisível do todo, alimentado pela mesma Fonte Central.
Quando deixamos de nos perceber como seres álmicos que, aqui na Terra, dispomos desses corpos como veículos, ficamos desligados da Fonte e, em consequência, da verdade. Aí passamos a acreditar apenas no visível, na matéria, no corpo, que são somente meios, ferramentas, facilitadores, como o dinheiro. Então, ficamos à mercê da Matrix, atrapados nos fios da teia que manipula tudo isso e a nós mesmos. E que, entre tantos instrumentos, utiliza o sofrimento.
Se você repara na construção dos fundamentos de pseudo-filósofos ou pseudo-religiões, comprovará que toda tese reivindicativa do sofrimento é uma mera afirmação arbitrária, caprichosa, porém ninguém tem argumento certo para asseverar que Deus alguma vez tenha enviado algum tipo de mensagem indicando a necessidade da dor ou do medo como condição para aprender, melhorar, crescer.
Tudo pelo contrário. Os voceros direitos da Fonte/Deus/Grande Espírito, como o caso de Jesus e outros, só falaram em amor, compaixão, misericórdia.
A ideia do sofrimento não pertence à divindade, trata-se de um conceito concebido no seio da humanidade.
Esses tipos de conceito estão hoje em processo de dissipação na medida em que expandimos nossa consciência, nossa capacidade de perceber a realidade sem ilusões e compreender como são e como funcionam as coisas. Para o qual, claro, devemos permitir-nos estar abertos, atentos, sem preconceitos e até sem conceitos, pois o que é é o que é, o resto é perfumaria.
Estamos neste mundo para aprender e sanar. As respostas para o tratamento de toda dor e para evitar o sofrimento estão em nossos corações. Aí temos todas as chaves para essa solução, bastando apenas ouvir nossa intuição, permitindo-nos manifestar as vontades que ressoam em nossa luz.
Não estamos sozinhos. Por baixo e por cima do entramado trapaceiro da Matrix, cósmicas ondas de energia positiva se expandem pelo planeta, tocando nossos corações, chamando-nos para o despertar. É para tomar consciência da verdade, assumindo o ser espiritual que somos e nossa condição eterna, por cima dos meios materiais dos que dispomos neste plano terrenal. Necessários e úteis mas não essenciais, eles apenas servem durante o breve lapso desta passagem para experimentar situações exemplares das quais tiramos as lições para crescer e evoluir como entidades álmicas. São ferramentas que não iremos levar a parte nenhuma quando a gente saia para fora do círculo.
Se fazemos consciência do imprescindível equilíbrio entre materia e espíritu como condição proveitosa para nossa experiência, poderemos evitar o apego inconsciente e bobo à matéria - incluindo nosso corpo -, debilidade que a Matrix utiliza para nos manter presos, despersonalizados, escravos de seu projeto antinatural, abusivo, cruel e sofredor.
Nosso aprendizado não tem nada a ver com competição, confrontação nem guerras de tipo nenhum. Tem a ver com as leis universais que explicam a existência e o comportamento da galáxia e de nós mesmos e com os valores que propiciam a harmonia da ordem na hora do caos e cujo basamento vital é a energia insustituível do amor.
Na crise terminal da atual civilização, onde a separação do joio do trigo gera o desconforto do estresse e até a agonia da incerteza, não será com o antagonismo nem a luta com nossos semelhantes que iremos encontrar a paz, mas com a colaboração e o sentimento de união na irmandade, iluminando a verdade que nos ensina que, além de nossas benditas diferenças, em nossa essência, somos todos um. E ninguém está condenado a sofrer. ✤



0 comments